Entrevista com Mário Testoni Jr do Casa das Máquinas

"Para nós do Rock, acredito que irá melhorar. Teremos... espero que, um novo conceito de música, de poemas, de vida e com certeza, mesmo que demore a mudança já começou."

    A veterana banda Casa das Máquinas que é uma das mais importantes do Rock Brasileiro e que já gravou seminais álbuns como Casa de Rock e Lar de Maravilhas, infelizmente encerrou suas atividades em 1978, retomou somente em 2007 e em definitivo mesmo há poucos anos. E após uma reformulação no line up, a banda lançou o single A Rua, já prepara um novo álbum de inéditas para este ano e tinha por objetivo voltar para a estrada antes desta pandemia parar tudo.

    Sobre estes temas, algumas curiosidades do passado e futuro da banda, a dupla Fernando R. R. Júnior e André Torres do Rock On Stage tiveram a honra de conversar com o simpático, atencioso e animado tecladista Mário Testoni Jr. e o resultado pode ser conferido nas linhas abaixo: 

Rock On Stage: Como foi a origem do Casa das Máquinas? E como que a música e - especificamente - o Rock entrou na sua vida?
Mario Testoni Jr.:
O Casa veio da banda Novos Incríveis, logo após a gravação do seu primeiro trabalho ( LP ), o empresário da época achou melhor mudar o nome da banda e assim surgiu o Casa das Máquinas, que depois de meados de 1978 teve uma parada, onde voltou em 2016 definitivamente e está até hoje na estrada.

    Bem, eu comecei a estudar música com 5 anos de idade, acordeão e piano, apesar de ter sido um estudo Erudito, nasci em 1954 e o que logo despontou foi o Rock, tendo o conhecimento musical e a mídia da época com 90% de Rock, não teria como não ter sido influenciado para o Rock, ainda bem.

Rock On Stage: Tivemos uma reformulação no line up do Casa das Máquinas em 2019 com as saídas de João Luiz ( vocal ), Marcelo Schevano ( guitarra ) e Fábio Cesar ( baixo ) e a entrada de Ivan Gonçalves, Cadu Moreira e Geraldo Vieira em suas posições. Que motivos levaram a esta reformulação e como foi a escolha dos novos integrantes?
Mario Testoni Jr.:
Na verdade foi em 2018, o Marcelo e o João tiveram um convite para entrar no Golpe de Estado e acabaram aceitando, além de uns desentendimentos comuns na convivência, nessas acho que o Fábio acabou indo no embalo e também saiu. Para todos o Casa acabava de acabar, mas não foi desta forma, eu e o Marinho decidimos seguir em frente e convidamos o Cadu, o Geraldinho e o Ivan.

    E é com essa formação que o Casa consegue seguir em frente com shows e um novo trabalho com a parceria da Monstro Disco. Se não fosse essa pandemia que estamos vivendo, o Covid-19, no final de junho estaríamos lançando um CD, Vinil e talvez até K7. Estamos com 5 faixas prontas e estamos lançando em todas as plataformas digitais: a primeira foi A Rua.

 

Rock On Stage: Sim, justamente sobre o single "A Rua" é a próxima pergunta. Como é voltar a compor depois de tantos anos? E o que pode nos antecipar do novo álbum que deve sair até o final do ano; como tem sido os seus processos de composição, gravação e produção? E quais suas expectativas quanto à aceitação do público e da imprensa especializada?
Mario Testoni Jr.:
Não é bem voltar a compor, pois, já tínhamos algumas coisas em andamento há alguns anos. A música A Rua por exemplo, tem uns 25/28 anos, ela foi composta pelo Aroldo Binda, primeiro guitarrista do Casa e fundador junto ao Netinho do Casa. Claro que a motivação que estamos tendo, talvez seja maior da que tivemos na década de 70, pois, desde 76 não fizemos nada de novo, mamamos nessa teta durante todos essas décadas, tentamos gravar mas nunca deu certo.

    Numa conversa com o Schevano, ele me disse que tinha que ter essa mudança ( a saída deles e a entrada de novos "soldados" ), e é verdade. Quando não se tem mudanças, não se tem movimentos. O novo álbum será um segmento do que o Casa fez, com Rocks Progressivos e Clássicos. Faltam 5 faixas que já estão em andamento, precisamos terminar e lançar. Quanto às expectativas, acho que o público e a imprensa é que vão ter quando ouvirem o trabalho todo. De nossa parte está sendo positiva, pois, estamos cuidando muito bem da nossa mais nova "CRIA", é como se fosse um filho, com muito carinho, respeito, dedicação para que dure para sempre.

Rock On Stage: Mesmo composta há mais de 20 anos, a canção "A Rua' faz sentido nos dias de hoje, porque?
Mario Testoni Jr.:
O Casa nunca tratou em suas letras sobre nenhuma crítica política ou social, porém, dessa vez acho que chegou a hora. 'A Rua' trata de um problema que existe já faz alguns anos e nada mudou, ou melhor piorou. Pois fala das crianças que vivem nas ruas, sem ninguém fazer absolutamente nada, nem nossos governantes como seus semelhantes. Acho que na verdade se existe um vírus, esse vírus somos nós: seres humanos.

Rock On Stage: A atual mudança que esta pandemia está provocando na sociedade será muito grande e o setor do entretenimento é sem dúvidas um dos mais afetados. Te pergunto, qual o tamanho da vontade para estar no palco novamente diante dos fãs? E quais iniciativas vocês têm feito para amenizar esta saudade e manter o nome relevante em um período que ainda temos que conviver com os downloads ilegais e as baixas vendagens dos discos?
Mario Testoni Jr.:
O tamanho não dá para dimensionar, claro que nossa vontade de estar nos palcos é imensa e sentimos falta. Sem dúvida, o setor de entretenimento sofre muito, mas, se reinventa com lives, vídeos, entrevistas online, etc. Nunca se teve tanta música sendo de alguma forma executada a cada minuto.

    Não importa o tipo de música: quem as faz, como faz, o fato é que a ARTE é o que está segurando o lado EMOCIONAL do planeta, com downloads que sempre foram feitos. Desde as fitas K7, hoje mudou o nome da PIRATARIA, e as baixas vendagens é o resultado da velha fórmula: você colhe aquilo que planta. Na década de 70, quando saí do Casa e fui para o Pholhas, se vendia 1.500.000 cópias, hoje quando se vende 50.000 cópias, se acham os "reis da cocada".... a época mudou vivemos outra cena.

Rock On Stage: E qual a sua análise do mundo e do mercado Rock'n'Roll no pós coronavirus?
Mario Testoni Jr.:
Acho que o mundo jamais será igual. Na verdade espero que mude e muito, o VÍRUS homem, tem que ter mais responsabilidade, respeito, dignidade, honestidade, amor. Somos o único animal que mata por prazer, sem princípios, sem nada. Para nós do Rock, acredito que irá melhorar. Teremos... espero que, um novo conceito de música, de poemas, de vida e com certeza, mesmo que demore a mudança já começou.

Rock On Stage: Aliás, ainda neste tema como você avalia a atual geração que nos shows fica quase o tempo todo no celular, seja filmando, enviando mensagens e fotografando, etc; porém, não interagem diretamente com a banda conforme acontecia no passado?
Mario Testoni Jr.:
Pois é, acho que é isso que respondi na pergunta anterior, o homem tem que mudar, tem que saber que não somos nada, temos sim, que sermos mais SERES HUMANOS RACIONAIS, e não isso que temos praticados como homens, claro que não são todos, mas sinto que a mudança começou.

    Olha só, eu moro num condomínio de chácaras, estou ouvindo de algum vizinho uma música barroca, tocada por uma flauta, nunca tinha ouvido isso antes, as pessoas estão renascendo. Essa coisa de celular, tablets, Internet, etc.... tem que ter mas, comedidamente. Não somos máquinas, temos uma alma, uma aura, um espírito. Temos que nos comunicar através dos nossos sentidos e não de ferramentas.

Rock On Stage: A conversa que o Rock’n’Roll vai acabar é um assunto que sempre vem à tona, como você imagina que será o futuro do estilo no Brasil? Existem nomes nacionais que você aponta que poderão seguir carregando a bandeira do estilo no futuro?
Mario Testoni Jr.:
Na verdade não temos mais Rock desde o final dos anos 80, temos sim os velhacos que insistem em continuar, ainda bem, assim alguém irá plantar uma semente que seja, é o suficiente para perdurar.

    Na verdade o Rock sempre foi difícil, foi marginalizado, mesmo na década de 70 era assim, o que era diferente é que a cultura era a favor, então a sua sobrevivência era mais tranquila. Espero que comecem a estudar música para poder fazer música. O título Rock, pode ser Pirulito, tem que ser uma boa música.

    O Rock Progressivo nada mais é do que uma Música Erudita tocada com instrumentos diferentes dos que os usados em uma orquestra. É bom lembrar que teremos que estudar e reaprender a se comunicar, ler para poder falar nossa língua o mais próximo do correto e aí sim, podermos construir letras, poemas, para as músicas.

Rock On Stage: Para você, quais suas cinco bandas favoritas e quais álbuns você citaria como fundamentais em sua vida?
Mario Testoni Jr.:
Tem várias, mas vamos lá:
 Deep Purple - Machine Head.
Yes - Fragile.
Cream - Disraeli Gears.
 Casa das Máquinas - Lar de Maravilhas.
Mutantes
- Tudo foi feito pelo Sol.
Claro que eu inclui o Casa das Máquinas, além de ser minha banda desde 1974, esse álbum sem dúvida é referência do Rock Brasileiro, mas, temos dúzias, centenas, milhares de bandas e nem citei Beatles, que sou fã de carteirinha.

Rock On Stage: No álbum "Lar de Maravilhas" temos músicas como 'Astralização' e 'Cilindro Cônico', que usam harmonias profundas de teclado. Hoje em dia, isso está dividido com guitarras pesadas e vocais guturais, que tiram esse foco astral que foi tão marcante, qual a sua opinião acerca da volta de um Progressivo raiz, que até nos leva a um ambiente espiritual/metafísico, para até nos ajudar em tempos difíceis com esta pandemia e a polarização do país.
Mario Testoni Jr.:
Falei bastante sobre isso de um modo figurado, mas com certeza dependendo do estilo, é claro, os teclados que vem do piano, são os instrumentos mais completos, podemos usar até 12 notas ao mesmo tempo, às vezes uma só já é suficiente. Mas fora isso, a tessitura num piano é completa, são as alturas, timbres encontrados em uma orquestra completa. Teremos na nossa "CRIA" com muitos teclados e poderemos ter umas viagens espiritualistas/metafísicas, por que não PSICODÉLICAS?

Rock On Stage: 'Sol Reflexo Ativo' é uma música com corais, teclado e a fala, de quem foi aquela voz? E sobre a letra, a mensagem de crítica foi para humanos, mas para quem?
Mario Testoni Jr.:
Na verdade são duas músicas, acabamos juntando como um medley, e acabou ficando muito bom. Na verdade um acústico com piano, teclados ( Mellotron, Arp e Elka Strings ), e quatro vozes, mais a locução feita pelo Netinho, numa crítica já para nós, seres humanos. Seria um Deus falando com os homens e tudo foi dito lá em 74. Acontece hoje numa escala muito, MUITO maior.

Rock On Stage: Nos anos setenta muitos homens, Rockeiros ou não, usavam plataformas e calça boca de sino, hoje só mulheres usam isso. Hoje a caretice está maior que os anos 70? Como vocês veem o comportamento das atuais gerações de garotos que curtem Rock'n'Roll?
Mario Testoni Jr.:
Esse é um lance de modismo, nunca me liguei muito com isso, usei cabelo compridão até uns quatro anos atrás, ou seja mais da metade da minha vida tive cabelos longuíssimos, uso até hoje jeans, tênis e camisetas.

    O careta é aquele que não aceita o que o outro faz ou usa. O muito louco, maluco, é aquele que entra num transe sem uso de nada. Sim, já usei muitas drogas, bebidas, cigarros. Hoje não uso mais nada disso e não me considero careta.

Rock On Stage: Que outras memórias você tem do Casa das Máquinas que ainda não foram relatadas em uma entrevista, como por exemplo um show que foi realmente marcante? Conte-nos algumas curiosidades.
Mario Testoni Jr.:
Já contamos várias passagens do Casa, mas uma marcante foi uma Tour que fizemos para o nordeste, saindo de Sampa e indo até Natal, tocando em várias cidades e em quase todas as capitais até lá, e de ônibus. Sim, tínhamos um Mercedes 362 se não me engano, aqueles Penha-Lapa, ahahahahahahah onde viajavam os músicos, equipe técnica e todo equipamento de som e luz, DEMAIS!

    Aconteceu de tudo, desde fugir de enchentes, correr de boi, ônibus quebrado durante 3 dias e nós dentro dele. Boas apresentações, estranhas, surpreendentes e até uma maratona até às sete e tanto da manhã, cumprida diante de um revólver, rs! Coisas do Rock and Roll.

Rock On Stage: Para você, qual dos três álbuns do Casa das Máquinas é o melhor e porque? E quais suas músicas favoritas?
Mario Testoni Jr.:
Particularmente, eu acho o Lar de Maravilhas na totalidade, mas, eu curto mais a música Lar de Maravilhas. Foi com a minha entrada e do Marinho Thomaz que essa mudança aconteceu, não que éramos melhores que outros, mas, a mudança trouxe movimento, e conseguimos todos, com uma química extraordinária fazer esse trabalho ser uma coisa muito boa e importante no cenário da música brasileira, mais especificamente no Rock.

Rock On Stage: Se fosse possível uma viagem no tempo em que você de hoje encontrasse com o jovem garoto que criou o Casa das Máquinas, o que diria para ele?
Mario Testoni Jr.:
Você foi corajoso e muito FODA.

Rock On Stage: Agradeço pela entrevista, fiquem seguros, sucesso nesta nova formação do Casa das Máquinas e que o quanto antes vençamos esta pandemia para que a banda volte para a estrada e nós possamos curtir os shows. Deixo o espaço para suas considerações e uma mensagem para os fãs.
Mario Testoni Jr.:
Eu falo em nome de todos nós do Casa, de todos técnicos, roadies, produtor, assessoria de imprensa e de mídias, secretário e nós músicos. Primeiramente eu quem agradeço a oportunidade de poder estar aqui vos falando, fizemos um longo bate-bola agradável e esclarecedor.

Nosso recado é: FIQUEM EM CASA COM O CASA!

    Fiquem com Deus e se protejam, se cuidem! Espero estar com vocês o mais breve possível nos palcos por este mundo mutável.

Por Fernando R. R. Júnior e André Torres
Agradecimentos especiais à Fani Moraes
Fotos: Leandro Almeida
Maio/2020

 

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